27 de março de 2009
23 de março de 2009
Lucílius Baptistum
A crueldade desportiva
Eu percebo que a profissão de árbitro não seja fácil - as decisões tomadas no momento nem sempre são as correctas. E as consequências dessas decisões podem ser imensuráveis, especialmente numa final - como a da Taça da Liga. Mas está feito. Os árbitros são apenas pessoas que cometem erros no exercício da sua profissão - tal como milhares o fazem, diariamente, no nosso país. E nem preciso enumerar que, assim de repente, todos nos lembramos de pelo menos uma mão cheia de errantes.
Se nos concentrarmos apenas no universo do futebol, temos duas soluções: ou crucificamos publicamente todos que erram - árbitros, jogadores de futebol, treinadores, presidentes de clube, adeptos, mascotes e emplastros, porque não?! Ou assumimos que toda a gente erra e que mais vale salvaguardar a verdade desportiva, recorrendo às novas tecnologias. Eu sigo por esta via e assino a petição do Rui Santos. Porque, se há dúvidas, faça-se rewind e comprove-se!
19 de março de 2009
Dia do pai
O que sentirá o pai que não conseguiu resgatar o filho de 4 anos do mar?
O que sentirá o pai que trancou e violou a filha durante 24 anos?
Os que amam os filhos incondicionalmente?
Os que temem perder os filhos tragicamente?
Os que perderam os filhos estupidamente?
Os que negligenciam os filhos diariamente?
Os que abusam dos filhos continuadamente?
Perpétua
17 de março de 2009
O homem-monstro que queria arquivar a vergonha
Mas há coisas que não se arquivam. Porque são demasiado complexas, não cabem em dossiers, não são catalogáveis ou não tiveram ainda um fim para serem remetidas ao esquecimento. As atrocidades do Monstro não são - nem nunca serão - arquiváveis. Porque, da mesma forma que o pó não assentará na memória das vítimas do homem-monstro, o mundo não permitirá que o pó assente no dossier azul.
Monstros
Com a idade, a teimosia esbateu-se e deixei adormecer a ideia de que os montros existiam. Deixei de espreitar debaixo da cama e de recear o escuro. Mas - não faz muito tempo - fui sacudida abruptamente durante o sono tranquilo. Um monstro saiu da escuridão - "buh". E era um monstro real - o Monstro de Amstetten. Toda a gente o viu, com horror. E toda a gente desejou que ele não passasse da imaginação de uma criança. Acontece que nem a mais fértil imaginação conseguiria conceber um Monstro tão hediondo como aquele.
Papa afirma que a sida não se combate com preservativos
Parece que - para Bento XVI - o combate à sida não se faz com preservativos, mas sim com abstinência sexual. Tem lógica. Se não houver sexo, para que precisamos de preservativos? O problema reside, precisamente, em não haver sexo. Problema esse de que não sofre Bento XVI. Portanto - sugiro eu - que tal um workshop dado pelo Santíssimo ao mundo. "Como resfriar o apetite sexual" - "sem infringir a lei", acrescentaria eu. Pergunto: no meio desta abstinência toda, onde é que fica a reprodução da espécie?
Fumo branco para este senhor.A diferença entre um mealheiro e uma vagina
Normalmente - e atenção que a tendência aumentou depois do caso BPN - as poupanças guardam-se em mealheiros. E o que não faltam para aí são mealheiros. Todos nós já comprámos ou pensámos em comprar um. De cerâmica, pelúcia, plástico, verde-esperança, azul-bebé, amarelo torrado ou rosa-choque. É indiferente. A forma do mealheiro é, no entanto, mais consensual. Geralmente, quando se fala de mealheiro fala-se do porquinho-mealheiro. Desenganem-se se julgam que vou fazer um trocadilho com as palavras porquinha e porquinho. Adiante.
Há ainda outra característica importante a ter em conta na escolha de um mealheiro. Uma característica que distingue também uma conta à ordem de uma conta a prazo. Se, como numa conta à ordem, pretendermos recorrer ao dinheiro quando a necessidade falar mais alto, compramos um mealheiro com um buraquinho no fundo. Uma espécie de "easy-way" a que acedemos quando nos vemos obrigados a desfalcar as poupanças. Se, pelo contrário, formos poupadinhos e perfeitamente capazes de gerir o dinheiro sem recorrer ao porquinho, não precisamos de mealheiros com buraquinho no fundo. O problema é que, quando quisermos aceder ao interior do porquinho, teremos de o partir. Desfazê-lo em pedaços.
Ora, o caso desta senhora que guardava as notas na vagina baralhou-me. Como raio é que se guardam notas na vagina? Se fosse nas cuequinhas, eu ainda percebia - não que já o tenha feito - mas, na vagina?! Parto do principio que o local exacto onde a senhora guardou as notas foi, de facto, na vagina. Porque, caso contrário, o Correio da Manhã dizia (certo?). Bom, pressupondo que era mesmo na vagina que a senhora guardava as notas, pergunto eu: como diabo é que ela as tirava de lá?
Pensamento inevitável: por que lugares estranhos andaram as notas - e moedas - que nos passam pelas mãos?
13 de março de 2009
Superstição geni(t)al
A todos os que andam p'raí a estourar tempo e dinheiro em hormonas e operações, deixem-se disso! Passem por debaixo de um arco-íris e puff... despeçam-se do velho sexo. É rápido e indolor. Mágico. A estória perfeita para contar aos netos: "E debaixo do arco-íris colorido deu-se magia e o avô transformou-se na avó".
Pergunto eu: o pote de ouro no fundo do arco-íris era, afinal, uma metáfora?
O cúmulo da superstição
12 de março de 2009
Agora, quando te perguntarem "Porque é que lês isso?" já podes responder "Sei Lá, é à borla!"
A escritora e a Oficina do Livro foram condenadas ao pagamento de indemnizações por danos morais aos quase 200 mil compradores do livro. Além disso, têm até ao final do mês para retirar das livrarias todos os exemplares destinados a venda. Na base da decisão do Tribunal estão os crimes de extursão dissimulada de leitoras carentes, influenciáveis e/ou desocupadas, divulgação de mensagens subliminares de estupidificação, prevaricação e abuso de poder.
Margarida Rebelo Pinto saiu do Tribunal visivelmente abalada e garantiu que esta decisão não a vai impedir de continuar a escrever, anunciando "o lançamento do próximo livro para breve". Quando questionada sobre se Vasco Pulido Valente vá gostar do próximo livro, responde simplesmente: "Sei lá! Alguém sabe do que ele gosta?"
Atenção que muitos dos factos relatados neste artigo são verdadeiros.
10 de março de 2009
Eu sou um dia bonito.
The heart is a bloom, shoots up through the stony ground But there's no room, no space to rent in this town You're out of luck and the reason that you had to care, The traffic is stuck and you're not moving anywhere. You thought you'd found a friend to take you out of this place Someone you could lend a hand in return for grace
It's a beautiful day The sky falls and you feel like it's a beautiful day Don't let it get away
You're on the road but you've got no destination You're in the mud, in the maze of her imagination You love this town even if that doesn't ring true You've been all over and it's been all over you
It's a beautiful day Don't let it get away it's a beautiful day
Touch me, take me to that other place Teach me, I know I'm not a hopeless case
See the world in green and blue See China right in front of you See the canyons broken by cloud See the tuna fleets clearing the sea out See the bedouin fires at night See the oil fields at first light and, See the bird with a leaf in her mouth After the flood all the colours came out
It was a beautiful day Don't let it get away Beautiful day
Touch me, take me to that other place Reach me, I know I'm not a hopeless case
What you don't have you don't need it now What you don't know you can feel it somehow What you don't have you don't need it now You don't need it now
Was a Beautiful day...
9 de março de 2009
Salvem os taxistas!
Agora, imagine-se que os teenagers portugueses lhe seguiam o exemplo? Estão a imaginar o boom de motoristas da Carris a dar entrada nas urgências do Santa Maria ou do São José? Pior ainda. Conseguem imaginar a carnificina que seria no caso dos taxistas? Quer-me parecer que contaríamos pelos dedos de UMA mão os "fogareiros" que escapassem ilesos de uma corrida. Os restantes não se livrariam, certamente, de uns valentes tabefes e de uns socos bem dados. E olhem que, pensando bem, talvez não fosse má ideia. Como diz a minha mãe, uma chapadinha bem dada nunca fez mal a ninguém! Pois - se é esse o caminho para disciplinar os taxistas portugueses e levá-los à remissão dos seus pecados - porque não? Teenagers portugueses, o futuro está nas vossas mãos (firmes)!
Estórias de desadormecer
Fora do carro, noite escura. E o carro rolava a medo numa estradita rodeada de mato e mal iluminada. Dentro do carro, cinco alminhas assustadas falavam de almas penadas. De ocorrências estranhas e inexplicáveis à luz da ciência. Do chamado oculto.
- Mas quem é que puxou esta merda de conversa?
O responsável lá se acusa. Arrependido, decerto, por essa altura. Mas, coitado, tinha puxado o assunto de forma perfeitamente inocente e no seguimento de uma qualquer banalidade - algo como: "Ah, e por falar nisso...". Mas, inevitavelmente, estava puxado o primeiro fio de um novelo de "coisas estranhas". A partir dali, cada um dos cinco teria certamente algo a acrescentar. Algo que lhe acontecera a si, a um amigo, a um familiar, a um amigo de um familiar e por aí fora. O novelo do inexplicável desenrolava-se a cada estória, surreal, e parecia interminável. Sufocava o habitáculo do pequeno carro e cada um dos seus ocupantes.
- Porra, calem-se lá que já estou todo arrepiado. - Quem o diz é o condutor.
Uma alminha solidária no banco de trás muda imediatamente de assunto. "O jantar estava muito bom." Respira-se de alívio, mas ninguém atenta verdadeiramente no novo assunto. O pensamento ficou mais atrás, a martelar num qualquer pormenor macabro de uma ou outra estória. E não demora muito até se voltar ao assunto anterior. Porque a curiosidade fala mais alto. E porque há no oculto uma espécie de atracção sado-masoquista. Morre-se de medo de falar em espíritos e assombrações, mas fala-se!
- É impressionante como estas conversas surgem sempre à noite.
8 de março de 2009
Homens já se atrevem a ter profissões de mulheres
7 de março de 2009
A um sábado cheio de sol e à boa-disposição
Impossível não cantar.
Impossível não sorrir.
Grande Johnny Nash.
Grande sábado.
6 de março de 2009
Nem o Parlamento escapa ao vendaval
5 de março de 2009
O vendedor do quiosque (julga que) dá borlas em tempo de crise!
Três moeditas de euro em cima do balcão de madeira chegavam e ainda davam direito a troco. Mas o ar indignado do senhor, que ora apontava para o canto superior direito da revista - onde estava a imagem do livro e a frase "por apenas + 0,50€" - ora apontava para as três moedas de 1€.
- Isto não chega.
- Chega, sim. Porque eu só quero a revista, não quero o livro.
E o senhor, não convencido do que eu lhe dizia, continuou, insistente.
- Vem com livro, é mais caro.
Pacientemente, lá lhe expliquei novamente que não queria o livro. Só a revista. Até lhe disse que às vezes o livro vem no interior da revista, mas ali nem era o caso. A revista mantinha a espessura normal, ou seja, não havia dentro dela nenhum livro.
- Talvez você o tenha guardado aí dentro, nalguma dessas prateleiras. Entre os outros brindes, sei lá.
- Não, aqui não tenho nada - retorquia o homem, cada vez mais mal-disposto.
E eu ali, ao vento e ao frio, de mala aberta, à espera da revista e do meu troco. Já me passava pela cabeça desistir ("fique com a merda da revista e com a porcaria do livro invisível!"). Mas vá, em mais um rasgo de paciência, abri a revista e folheei-a rapidamente.
- Vê, aqui não tem nada. Nenhum livro.
E qual não é o meu espanto quando o homem lança a mão à revista e tira dela um panfleto publicitário. Aquele panfleto de duas páginas com a campanha das assinaturas - "se assinar por um ano recebe mais seis meses grátis", algo desse género. E o sacana diz-me:
- Deve ser isto. Mas pronto, vai de borla!
E eu, completamente embasbacada, calei-me. Primeiro, porque não me apetecia ficar ali, ao vento e ao frio, a explicar-lhe que um panfleto publicitário de duas folhas não é um livro - há livros pequenos, mas nunca vi nenhum ter duas folhas. Segundo, porque o homem estava tão convicto de me estar a dar uma borla em tempo de crise que já nem falava, roncava! Claro que ainda tive de o convencer a dar-me o troco dos 3€ pousados no balcão . Parece que ele queria "deixar assim" - 2,85€ pela revista e 0,15€ pelo panfleto com pretensões de livro. Tenho para mim que, em tempos de crise, vale tudo.
Gente dos panfletos publicitários porta-a-porta, ponham os olhos nisto! Não deixem os panfletos atulhados nas caixas de correio. Vendam-nos!
Boys and girls alone
O que diriam Eduardo Sá e Daniel Sampaio de uma coisa destas em Portugal? E já agora, será que o Pedro Pinto - o boneco da sorte de Luciana Abreu - também participaria? Era capaz de lhe fazer bem alguma independência!
4 de março de 2009
SLAP, Carolina (assim é que é)
O que se faz quando não se tem nada que fazer?
3 de março de 2009
A melhor definição de amor desde Camões
2 de março de 2009
Conversa fictícia com o polícia da estória anterior... dez anos depois.
A mão direita daquele homem sentado apaga o filtro do cigarro no cinzeiro pousado mesmo ao seu lado. A mesma mão trémula alcança depois a garrafa de cerveja pousada mesmo ao lado do cinzeiro e acaba com o que resta nela. Acaba assim a conversa de duas horas e tal com aquele homem. E enquanto a mão direita matava quase em simultâneo um cigarro e uma cerveja, a mão esquerda permaneceu colada à face esquerda, sem dali sair. Foi assim durante toda a conversa. Naquele sofá, a mão esquerda raramente abandonou a face esquerda. O que poderia ser sinal de enfado, ali não o era. Aquela mão quieta, o cotovelo esquerdo apoiado sobre o joelho esquerdo empoleirado no outro, dizia-nos algo sobre aquele homem. O homem que gesticulava, bebia e fumava com a mão direita, enquanto agia como se o seu lado esquerdo não existisse.
Há dez anos atrás, a mão direita daquele homem não era trémula. Não o podia ser. Tinha de empunhar uma Walter de calibre7.65 mm com a firmeza que a profissão exigia. Há dez anos atrás, aquele homem era um agente da PSP ao serviço da Esquadra de Investigação Criminal do Barreiro. Há dez anos atrás, o agente Santos – hoje, apenas Santos – empunhava a sua arma com ambas as mãos, firmes.
- Só os duros conseguem segurar uma arma com firmeza em situações de perigo.
E Santos era “O Duro” lá da Esquadra, precisamente por isso. A sua alcunha de profissão acompanhava-o na PSP desde os tempos em que era novato. O agente de vinte e poucos anos, inexperiente, não hesitava sob pressão. Não recuava perante ameaças.
- Era o primeiro a puxar da arma e a olhar o perigo de frente.
Assim foi durante os dez anos em que esteve ao serviço da PSP. Excepto na noite em que foi baleado. Naquela noite, Santos entrou na casa de traficantes a gritar “Policia” e, como era habitual, avançou primeiro. Só que nessa noite – inexplicavelmente – Santos não puxou da arma. Manteve-a no coldre, sob vigília da mão direita enquanto a esquerda segurava uma lanterna. A casa estava às escuras. E assim ficou Santos depois de um estrondo e um clarão. Tinha sido atingido.
- Até hoje não sei o que me deu naquela noite.
Uma bala do revólver Taurus, de calibre 0.38mm. Acertou-lhe no maxilar superior esquerdo e desfez-lhe o céu-da-boca.
Santos ficou inconsciente, caído no chão do corredor daquela casa, às escuras. A história do que se passou a seguir foi-lhe contada mais tarde, pelos restantes protagonistas, os seus colegas na rusga. Foram eles que lhe valeram.
- Agiram depressa e impediram que o traficante disparasse sobre mim outra vez.
Os agentes Simões, Tavares e Cunha ainda trabalham na PSP, mas já não são agentes no terreno. Têm cargos administrativos na polícia, até atingirem a idade da reforma. Reforma que, para o colega Santos, chegou mais cedo. Sem “O Duro”, os três agentes ainda trabalharam no terreno durante mais alguns anos. E nunca mais tiveram um susto como naquela noite de há dez anos atrás. Todos se lembram com clareza do que aconteceu.
Depois de Santos ter sido atirado para trás com a violência do disparo e ficar caído no chão com a cara desfeita, os seus colegas agiram por instinto. O mais prudente a fazer seria recuar para um ponto seguro e negociar com o autor do disparo e possíveis cúmplices. Com a casa às escuras e a porta entreaberta não se sabia quantos traficantes poderiam estar naquele espaço. Só se sabia que, por detrás daquela porta, havia pelo menos um sujeito armado. Mas o colega caído, inconsciente, fizera-os esquecer o protocolo. Os três agentes avançaram imediatamente. “Bora, bora, bora”. O agente Simões dava a ordem aos colegas que o seguiam. Era ele que, antes, seguia logo atrás de Santos. Os três avançaram com as armas em riste – sempre as tiveram seguras entre as mãos, desde que entraram. O Simões pontapeou a porta de uma vez só e gritou para dentro “largue a arma. É uma ordem!”. Nessa altura, Tavares e Gandarez já estavam posicionados nas costas do colega. Os três formavam um bloco que separava Santos do traficante que o abatera. Era só um. Amedrontado, largou imediatamente o revólver Taurus.
- Ficou tão aflito por nos ver. Devia pensar que os polícias fazem rusgas sozinhos.
Até hoje, Simões não percebe como é que se dispara sobre um polícia. Nunca se sai impune de um acto como esse. Enquanto algemava o traficante, Simões reparou que ele olhava com remorsos para a figura do Santos em sangue. “Estás arrependido cabrão?! Mas olha que vais ficar ainda mais depois de uns aninhos na gaiola.” Terá sido qualquer coisa deste género que lhe gritou, enquanto o agente Tavares estancava com as suas mãos o sangue no pescoço de Santos e o agente Gandarez chamava assistência médica.
Dez anos depois de ter deixado a polícia, Santos ainda mantém contacto com os colegas que, acredita, lhe salvaram a vida. Bebem uns copos juntos, de vez em quando. Uma ou duas vezes por ano também se junta a eles e a outros ex-colegas nos torneios de sueca, de damas e nos jogos de malha que são organizados no campo de férias da PSP de Peniche. Vai a esses torneios mais por insistência da mulher do que por vontade sua.
A mulher não se conforma de o ver sempre trancado em casa. Maria ainda é Procuradora do Ministério Publico do Barreiro, como há dez anos atrás. Acredita que se tornou muito mais empenhada na sua profissão, desde o que aconteceu ao marido.
- Tirei uma lição do que aconteceu ao meu marido. A justiça tem de proteger mais e melhor os agentes no terreno, poupando-os do maior número de ameaças possível.
Hoje, Maria é a Procuradora do Ministério Público conhecida como “ A Dura”. Curiosa coincidência a das alcunhas lá em casa. Maria é frequentemente indicada como sucessora de Sá Fernandes na Procuradoria-Geral da República. E Santos tem orgulho na mulher, “claro”.
- Ela faz o que eu já não tenho forças para fazer.
Santos não se refere a forças físicas, certamente. Aos 42 anos, continua com um peso e desenvoltura física semelhantes aos que tinha quando era agente. Faz questão de manter as mesmas 200 flexões por dia, logo depois da corrida matinal, que religiosamente faz – das 9h às 11h, mais ou menos – depois de a mulher sair para o trabalho. A corrida é, normalmente, o único momento do dia em que sai de casa. Costuma passar as tardes a ver televisão ou a jogar consola – jogos que tenham armas, de guerra ou de combate, obrigatoriamente. Aos outros jogos não acha piada. A consola é um vício antigo, já jogava quando ainda estava na PSP. Só não o fazia com tanta frequência.
- Dantes era um hobby. Agora, é um refúgio.
Vícios recentes tem dois: o tabaco e a cerveja. Chama-lhes “o vício da reforma”. E sorri ao dizê-lo. É o primeiro sorriso da conversa. E já passaram quase duas horas. Na mesinha de apoio – junto ao cinzeiro lotado e às duas garrafas de cerveja, uma vazia e outra a menos de metade – uma moldura com Santos a meio-corpo. Fardado. Mais novo. Com os dentes mais brancos. E sem cicatrizes no lado esquerdo da cara.
- A fotografia foi tirada no dia da minha cerimónia do "compromisso de honra".
O jovem Santos integrava a Polícia de Segurança Pública com 22 anos.
- Nesse dia cumpria um sonho. E as expectativas eram grandes.
Terminariam, dez anos depois. Aos 32 anos, Santos reformou-se. Por vontade própria, depois de ter sido baleado e de ter ficado com mazelas para toda a vida. No entanto, nunca se arrependeu de ter entrado para a polícia.
- Enquanto lá estive prendi uns quantos. Ajudei a fazer justiça. Mas tudo o que tem início, tem um fim.
E Santos pôs fim à sua carreira por já não se sentir capaz de continuar.
- Já estava a ficar desleixado no meu trabalho. A prova disso é que não puxei da arma nem agi com precaução. Devia pensar que era o super-homem e que nada me acontecia.
Aconteceu. Naquela noite de há dez anos, Santos tombou, coberto de vermelho. Era a tonalidade do sangue que o rodeava. Infelizmente, não era o vermelho da capa do super-homem.